sexta-feira, 6 de julho de 2012

São Jorge, timão, guerreiro campeão!

 Tabu foi feito pra ser quebrado. Corinthians conquista a América...

O médico o conhecia. Vendo os exames, falou firme:

- Antonio, se daqui pra frente você colocar um copo de bebida na boca. Uma gota de álcool, que seja: é vela e caixão. Teu fígado está prestes a virar geleia. Parece que não quer ver o Corinthians campeão da Libertadores?

Medicado e recomendado chegou a casa. A mulher ouviu o desabafo e se preocupou com a criação do casal de filhos.

À noite, Antonio vestiu a camisa alvinegra. Tomou chá e os comprimidos. Assistiu no rádio o empate de 1 a 1, na estreia, contra o Dep. Táchira.

Não perdeu, tá bom. Mas maldisse a si mesmo quando se lembrou do litro de cachaça escondido: Pô, nem um gole?

Já no sexto jogo da fase de grupos, o timão sem perder, Antonio se medicou com prazer após a goleada de 6 a 0, no jogo de volta, contra o mesmo Táchira. Voltou a caminhar pelas ruas e titubeou quando um amigo o convidou pra tomar uma.

O apego a São Jorge. A flâmula no altar. A lamparina acesa. Mataria um dragão por dia pra ver o Corinthians campeão. Agradeceu e retornou contando a campanha na mente: 4 vitórias e dois empates.13 gols marcados e dois sofridos.

Melhorava aos poucos. Resistia. A abstinência causava pesadelos. Nas quartas de finais satisfez-se com o empate zerado em São Januário. 

O lance do Diego Souza e o goleiro Cassio, que, com a ponta da luva mudou a trajetória da bola, quase o levou a uma recaída. Foi salvo pelo gol de Paulinho e a classificação por 1 a 0.

Dores o incomodavam nas semifinais na baixada santista. E se o Santos aprontasse alguma molecagem? Temia. 

Mas vendo a postura do seu time. O empenho. O golaço do Sheik. A união dos jogadores transbordando além-campo. Sentiu-se confiante e tomou suco de laranja.

Na partida seguinte, quando ouviu o silêncio fúnebre no estádio, após o gol de Neymar, Antonio se apegou ao santo. Pediu carona no cavalo branco. Segurou a lança numa das mãos e na outra a aguardente, caso necessitasse de suicídio.

Danilo, Danilo, Danilo, balbuciava dormindo no sofá. O martírio estava chegando ao fim. Enfim, o Coringão decidia a história!

E veio o Boca Junior. Irritante Bambonera não se cala. O resultado adverso de um a zero. O tremor nas mãos. Sua via crucis. O livre arbítrio. Nem um gole? Árbitro desgraçado, não vê como eles jogam sujo?

Chegou a levantar-se em direção ao esconderijo. Romarinho entrara no jogo e recebeu passe de Sheik. Invadiu a área, e com uma cavadinha sobre o goleiro argentino marcou um golaço, trazendo, de quebra, Antonio em repouso à poltrona.

Na quarta-feira seguinte, o Pacaembu totalmente tomado. É hoje! É o fim da peregrinação. Bola rolando e nem o antijogo dos hermanos foi capaz de desestabilizar a homogênea equipe alvinegra. Sheik, promovido a monstro sagrado, marcou duas vezes.

Apito final. O inédito troféu inundava-se em lágrimas dos fieis guerreiros. Rojões iluminam cânticos em glória. A noite virou dia. Antonio tem a voz embargada pela emoção. De joelhos, mãos estendidas em louvor a São Jorge seguram um copo cheio de pinga.

Seu pensamento: 8 vitórias e 6 empates. 22 gols marcados e 4 sofridos.  Eu estou vendo, doutor! Eu consegui! Meu Corinthians é campeão da América! E invicto! Chupa essa, berrou pro palmeirense vizinho.

Com os olhos arregalados em profunda sede, levou o copo à boca. Em ritual, cheirou a bebida e saudou o santo. 

- Meu Deus! gritou paralisado quando o dragão expeliu enorme facho de fogo. Atônito, ouviu São Jorge esbravejar:

- Não quer ver o Corinthians campeão do mundo, Antonio?

Sorriu na manhã seguinte. Beijou a mulher e as crianças. E o sonho por mais um título recomeçou.

Emerson Sheik honrou o manto sagrado.

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