sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Dorinho, eco de um gol que passou!

Dorinho (esq) e o Zé do Gás, em foto do Leão do Morro, de 1960.
Há dois anos escrevi esta crônica, reproduzida hoje, no mesmo dia de sua morte...

Estava no estádio durante a Copa São Paulo de Juniores e alguém me falou:

- Você ficou sabendo que o Dorinho morreu?


Não o sabia. Mas, o triste fato aconteceu no dia 26 de dezembro de 2006, dois dias antes dele completar 66 anos.

Dorinho, de nome Theodoro Júdica Junior, apontado por todos que o viram em ação como o maior craque que a várzea viu jogar.


Isso nos áureos tempos do futebol varzeano da Vila Madalena.

De campos que hoje vagam na idéia de poucos. De times que são somente lembranças; Leão do Morro, 1º de Maio, 7 de Setembro, Brasil de Pinheiros, Serepe...


Dorinho foi marca. Canhoto habilidoso. Exímio cobrador de faltas. Não foi profissional porque era vadio, numa boa. Gostava do samba, da farra, da boemia em parceira com a bola.


Tinha tudo para dar certo. Jogou com Dudu, Bazane, Rosan, na Ferroviária de Araraquara, quem se lembra?

Pegou o trem de volta e não apareceu mais. Como ele me disse:

- Me especializei nos gramados carecas, varzeanamente falando...


Entre os amigos tinha um carinho especial com aqueles que jogaram com ele, na época:

Miura, Carminho, Zé do Gás, Tiziu, Zé Cavalo, Filú...

E dos mais recentes quando em Taboão veio morar, o Doriana.

E aí eu me coloco entre os apelidos dessa tão intensa e curta pelada da vida.


O Dorinho tinha uma maneira própria de se expressar. As frases eram precedidas por um sonoro ôôô!

E tudo, ou quase tudo se transformava em brincadeira. Vivia sempre pronto pra qualquer balada.


Lembro-me que, certa vez, estávamos em um grupo de seis pessoas assistindo o CATS contra o Santos FC, divisão de base, no estádio.

Pouca gente além de nós na arquibancada. O nosso time perdia o jogo e não entusiasmava a pequena torcida.


Pra desbaratinar a monotonia, Dorinho começou a contar um caso do seu jeito, e eu reconto conforme o fruto que em mim ficou:


- Ôôô, tinha um cientista português que foi estudar uma aranha. Colocou ela em cima da mesa e com a tesoura cortou uma perna da aranha...

Então, o doutor bateu toc toc na mesa e falou: Ôôô, anda aranha, anda. E a aranha andou...


Sentado entre nós seguiu detalhando:


- Depois o homem cortou a segunda perna da aranha e disse: Anda, aranha, anda. E a aranha ôôô andou...


Já deve ter percebido o leitor que a piada é antiga. Mas, Dorinho, nos prendia atenção...


- Ôôô, de novo o doutor cortou mais uma perna da aranha. Anda aranha, anda. E a aranha andou...


Nem o gol de honra de Taboão nos fez mudar de atitude. Continuamos ouvindo com interesse e sorriso nos lábios.


E o doutor português pra adiantar a operação cortou três pernas da aranha e chamou:

– Ôôô, anda aranha, anda. E a aranha andou.


Você sabe quantas pernas a aranha tem? Então, resumindo o desfecho, eis:


- Ôôô, e aranha tava com duas pernas e o doutor português mandou: Anda aranha, anda. Ôôô, a aranha manquitolando ainda andou.


Imitando com os dedos o manco gesto, Dorinho arrematou:


- Ôôô, o doutor português deixou a aranha com uma perna só. Anda aranha, anda, anda. E a aranha não andou! Ôôô, o cientista português falou pra secretária:


- Ôôô, anota aí a conclusão. A aranha com uma perna só é surda!!!


Lembro que rimos muito, tal qual a maneira dele contar.

De recordação guardo imagens de momentos como esse, apertado abraço de amigo torcedor.

Mais que isso. Fica para nós, Dorinho, da sua vivência:

Ôôô, o eco de um gol que passou.

Goooolll!