"Há um tempão que eu queria recebê-los para uma conversa. Já fiz vários eventos com Sérgio. Vários com Pezão. Mas nunca assim, com os dois juntos", disse Freire ao abrir o evento que integra o Ciclo de Encontros Literários no Centro Cultural b_arco, em Pinheiros.
"Quem me apresentou ao Sérgio Vaz foi o jornalista David da Silva", respondeu Marco Pezão à pergunta de Marcelino Freire sobre como tudo começou.
Em 1999 eu ancorava um programa de notícias numa rádio-pirata aqui em Taboão da Serra. O Pezão fazia a crônica esportiva. Cada edição era encerrada com homenagem a um poeta. Naquele ano Sérgio Vaz lançava Pensamentos Vadios, seu terceiro livro. Cada um já conhecia o trabalho do outro. Sérgio já havia inclusive votado num poema do Marco Pezão num concurso literário. Mas foi naquele estúdio de emissora clandestina que se deu o primeiro aperto de mãos.
Para Marcelino Freire, "daqui a um tempo, quem for estudar a literatura brasileira terá de se debruçar sobre a trajetória destes dois, que criaram um movimento vigoroso de prática e difusão da poesia".
De onde vem
o poema
Os dois convidados de Marcelino Freire revelaram para a plateia os seus processos de criação.
Os dois convidados de Marcelino Freire revelaram para a plateia os seus processos de criação.
Para Marco
Pezão, o primeiro impulso para escrever veio do tempo em que fazia teatro. Daí
que sua poesia é altissonante, feita na medida para ser recitada em público. Sua grande influência veio do poeta Solano Trindade.
Pra
completar, a certidão de nascimento de Pezão traz a grife Iadoccico, vinda lá
da Itália famosa pelo seu povo falante e expansivo. Não à toa chama-se A
Plenos Pulmões o sarau que ele realiza na Casa das Rosas.
Como também
é repórter, boa parte da produção literária de Pezão vem dos noticiários. Seja um
corpo estendido no chão defronte à sua casa, ou o assassinato do terrorista Bin
Laden (com cujo nome brinca devido à aproximação com a expressão popular
"bimbinha", relativa a pênis).
No conjunto de sua obra ainda não publicada em livro, Marco Pezão é famoso no circuito da literatura marginal com sua premiada poesia Mina da Periferia. É dele também o poema que se tornou um hino para a cultura da periferia: "Nóis é ponte e atravessa qualquer rio".
Sérgio Vaz situa na infância rodeada por livros o seu apêgo às letras. Desfeitos seus sonhos de ser jogador de futebol e tempos depois letrista de canções, encontrou seu próprio caminho rascunhando poemas nos papéis de pão sobre o balcão do bar e mercearia de seu pai.
No conjunto de sua obra ainda não publicada em livro, Marco Pezão é famoso no circuito da literatura marginal com sua premiada poesia Mina da Periferia. É dele também o poema que se tornou um hino para a cultura da periferia: "Nóis é ponte e atravessa qualquer rio".
Sérgio Vaz situa na infância rodeada por livros o seu apêgo às letras. Desfeitos seus sonhos de ser jogador de futebol e tempos depois letrista de canções, encontrou seu próprio caminho rascunhando poemas nos papéis de pão sobre o balcão do bar e mercearia de seu pai.
Marcelino
Freire detectou um viéz trágico em duas das poesias lidas por Vaz no encontro.
Creio que
isto venha do seu DNA das Minas Gerais, famosa por exportar "minérios e
mineiros" e exalar sua melancolia entre as montanhas. Mas quem conhece o
poeta Sérgio em carne e osso sabe que ele á mais sorrisos do que introspecção.
Frasista incurável, e sarrista de temida pontaria.
Outra
característica marcante na vida e obra de Sérgio Vaz é sua já famosa
dificuldade de dormir. O cara é tão poeta que tem rima até na sua falta de
sono. O homem da insônia é casado com a Sônia.
Antes de
encarar o computador noturno, ele prepara seu café. Enquanto a água esquenta,
sua cabeça fervilha. Foi destas vigílias que nasceram atividades feito o Ajoelhaço,
a Chuva de Livros, a Poesia no Ar, o Cinema na Lage...
Uma saraivada de saraus
No ano 2000, poetas e outras pessoas amantes da poesia em Taboão da Serra se encontravam de forma fortuita no Bar do Portuga. Era a Quinta Maldita, onde Sérgio Vaz estreitou laços amistosos e etílicos com o seu então novo colega Marco Pezão.
Por estranha ironia, bem em frente ao boteco, no outro lado da rua, fica o enorme salão do centro municipal de recreação e cultura. Mas a própria sigla do lugar (Cemur) já sinaliza que sua maior destinação é a outros fins que não a Arte. Se fosse "Cemuc" a gente tinha mais chances, nénão?
Passado um tempo os poetas se tocaram que o tal "portuga" já não lhes sorria por trás do balcão. "Tá na hora de a gente achar um canto só pra nós", decretaram-se mutuamente Vaz e Pezão.
No ano e meio seguinte os poetas erguerram sua barricada literária no Bar Garajão, ainda em Taboão da Serra. O botequim fechou sem prévio aviso. Lá se foi a poesia procurar abrigo nas quebradas da zona sul da vizinha capital São Paulo.
A Cooperifa estava longe de sua terra natal. Mas Sérgio Vaz estava de volta ao bairro Piraporinha onde cresceu e amou suas primeira letras e leituras. Tudo em casa.
No ano 2004 os cooperifados adentraram no mundo editorial, com a antologia poética de 43 artistas anônimos da periferia. O nome do livro - O Rastilho da Pólvora - foi profético.
Em 2012 uma ong cultural elaborou o Mapa dos Saraus, contabilizando 60 pontos poéticos na região metropolitana, no interior e litoral paulista. Tem mais. Pode contar de novo que tem gente semeando versos por muito mais lugares.
E em cada um destes espaços de celebração da poesia estão as digitais dos pais da Cooperifa. Que já foi muito mais longe do que seus criadores possam imaginar.
O rastilho poético já cruzou divisas estaduais e fronteiras nacionais. Em Hamburgo, na Alemanha, duas semanas atrás, Sérgio vaz foi cumprimentado por um estudante alemão que já havia estado no Sarau da Cooperifa.
E nem no longínquo sertão pernambucano a Cooperifa dá sossego. "Estive em Ouricuri, a mais de 600 km de Recife, e lá me perguntaram se eu era amigo do pessoal da Cooperifa", contou Marcelino Freire.
Matéria e fotos do jornalista David da Silva, do blog barelanchestaboao.blogspot.com.br
2 comentários:
Só posso dar os parabéns e ficar orgulhoso pelos três. Ao Pezão, pelo Plenos Pulmões, no qual já estivesse e declamei; ao Sérgio, por também difundir a poesia e pelo Sarau, que ainda não tive a oportunidade de participar; e ao Marcelino, que também abrilhanta o cenário literário e por juntar esses dois num rico evento. Que mais espaços apareçam e que a poesia possa ser bradada sempre, seja a plenos pulmões, seja invadindo o céu em balões, ou ainda, espalhando-se cada vez mais nas redes sociais ou nas boas e velhas rodas de conversa, de boteco, de amigos. Abraços.
Grato, Manogon. Nóis é ponte e atravessa qualquer rio.
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