segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Poesia em ação

A passarela, da Praça da Bandeira, me leva à Faculdade de Direito do largo São Francisco, sexta feira, 11 de setembro.
Convidados pelo mediador Rui Macarenhas, os poetas, Robson Padial, o Binho, do Campo Limpo, Wagner Sampaio, da Brasilândia, Frederico Barbosa e Marcelo Tápia, ambos da Associação Poiesis, participam de um debate cujo foco é o desenrole da atual poesia.
Poesia, que, nessa década, tem se propagado na forma de saraus em cantões paulistas...

A Casa das Rosas e o Centro Acadêmico XI de Agosto da USP organizaram o encontro. Os poetas e assistência reunidos no pátio da faculdade. A palavra ganhou dimensão nesse dia dedicado a poesia, que também marcou a abertura de um circuito de saraus programados aos principais espaços literários da sampa cidade...

É o Sarau São Paulo iniciando suas atividades. O primeiro, à direita, é o Binho, vizinho parceiro do bairro de Campo Limpo, e que motivou esse retrateiro a acompanhar o ensejo...

Ladeiam o poeta e organizador Rui Mascarenhas, o diretor da Casa das Rosas, Frederico Barbosa, e Marcelo Tápia, diretor da Casa Guilherme de Almeida...

Experiências narradas ao longo da conversa. O professor, poeta e tradutor Marcelo Tápia falou de Guilherme de Almeida, formado em direito no Largo São Francisco em 1912, e, que, nesse mesmo saguão, começou sua caminhada pra figurar entre os grandes da literatura brasileira. Além de suas obras, dezenas de traduções marcaram a carreira de Guilherme de Almeida. Os haikais japoneses foram, por ele, divulgados no Brasil:

E cruzam-se as linhas
no fino tear do destino
Tuas mãos nas minhas


O poeta Frederico Barbosa é responsável pelo mapeamento dos saraus da capital paulista. Em estender a ponte que nos liga, na direção da Associação Poiesis, tem incentivado diversos cursos para poetas, escritores e iniciantes, com extensa programação na Casa das Rosas. No debate, lembrou de José de Anchieta e as primeiras letras. De São Paulo, com dez mil habitantes. Do início da Faculdade de Direito, de somente uma sala, trinta alunos, e apenas um professor para todas as matérias...

De Castro Alves, Fagundes Varella, Álvares de Azevedo, estudantes que marcaram época nesse paço por nós visitado, à poesia urbana que hoje se movimenta. O papo fluiu, de boa. Sério como a frase que corta, e ensina:

Escondemo-nos da miséria
Atrás de portarias
Vidros fechados
(Meu pai me comprou um ar condicionado)

Destaco a importância do encontro. Em conhecer Wagner Sampaio, representante do Sarau Brasa, da Vila Brasilândia, que, por falta de espaço dedicado à Cultura, encontrou abrigo num bar...

Em laço que ata e une, incentiva a declamação de poemas, a formação de novos escritores e leitores. Diante da necessidade - os livros são caros - a biblioteca Brasa fica exposta em cima da mesa de bilhar e tem revelado agradáveis surpresas...

Um trabalho que dura em torno de dois anos, o Sarau Brasa já promoveu a edição de quatro livros, com coletâneas e ilustrações dos próprios participantes...

É uma batalha dura, e o prazer vem revelado no questionamento. Na consciência que se adquire na formulação do verso seguinte. O poeta Wagner Sampaio declama a poesia publicada pelo Sarau Brasa...

Falar em Robson Padial, no Campo Limpo e arredores, poucos lembram quem é. Mas, Binho, com certeza, a maioria terá como referência a poesia. O Sarau do Binho, às segundas feiras, em seu bar, não é o bastante. Sua história é apimentada de irreverência e criatividade...

Entre 1996/97, o Binho criou a postesia ao sair catando placas de propaganda política e às devolvendo aos postes, repletas de frases incisivas, picantes e humoradas...

No debate, entre Wagner Sampaio e Marcelo Tápia, o Binho falou da poesia em ação, da motivação do pensamento em busca de avanços práticos. Citou, por exemplo, o apoio ao pré sal sob condição de ao menos cinco por cento de seu lucro ser distribuído diretamente a todo povo brasileiro. Em questionar a base militar americana na Colombia, promovendo a marcha de saraus a ambas embaixadas...

Autor de dois livros, o Binho promove o projeto Donde Miras, cujo olhar se alonga à América Latina. Diversas caminhadas poéticas já foram realizadas. A mais longa levou um mês pra chegar em Curitiba, mas o objetivo principal é andar até o Chile:

Você me rindo é muito lindo
Você me acaricia, eu cio
Meu amor não faz curva pra chegar até você
Me separo de mim
Pra você não me deixar


O poeta Fred estimula a presença dos poetas da periferia nos recantos culturais da cidade...

O público participou do debate buscando respostas às limitações existentes...

Em ouvir e ser ouvido, a conversação pontuou mais de duas horas...

Tempo benéfico para quem quer aprender e manter a chama poética acesa...

Fim desse capítulo, saio repleto ao som do poema declamado...

Não sem antes clicar a homenagem aos acadêmicos mortos no levante paulista de 1932...

Sampa que te quero sampa...

"A poesia concreta de tuas esquinas"...

Paisagem que vai mais longe...

Espelho, sou reflexo...

Em desejos que invadem a tarde...

Reflexão busca imagens...

De uma história que se conta e há de se contar...

Do Jardim do Éden, em plena avenida Paulista...

A novidade embarca no ônibus oferecido pela São Paulo Turismo...

A TV Cultura registra o embarque dos convivas...

Embora lente turva, registro. Marcelo Tápia e Fred, o sarau em andamento...

Pelas ruas seguimos fazendo nosso destino...

Os versos dos livros, livres à boca...

Paulicéia cada vez mais desvairada, Mário de Andrade...

Em te cantar, somamos. "Nesse nojo quase seres vivo cuspo luto morro", né Fred...?

A embarcação contém o incontível...

O poeta Chiu:
"Porta aberta
Um ruído vermelho
desvia-se da mesa
atravessando o balcão
As orquídeas sentadas nas cadeiras"

Ambulantes embalados no ritmo, atravessamos a praça João Mendes...

É dia 11 de setembro, o tempo não para, e a gente relembra e esquece tragédias noutras que se apresentam...

À frente, o Palácio da Justiça ficou para trás...

No Largo São Francisco pousamos...

Em retorno pra completar a arte...

Os poetas vindos de várias partes da paulistana metrópole...

Se encaminham à Faculdade de Direito do Largo São Francisco...

Monumento ao poeta. Álvares de Azevedo nasceu em 12/09/1831 e ainda garoto mudou-se com a família para o Rio de Janeiro. Retorna à São Paulo e matricula-se na Faculdade de Direito, em 1848. Viveu pouco para quem escreveu tanto. Com apenas 20 anos morreu vítima de tuberculose, na data de 25/04/1852.

Quando, a primeira vez, da minha terra
Deixei as noites de amoroso encanto,
A minha doce amante suspirando
Volveu-me os olhos úmidos de pranto

Um romance cantou de despedida
Mas a saudade amortecia o canto!
Lágrimas enxugou nos olhos belos...
E deu-me o lenço que molhava o pranto...

Quantos anos, contudo, já passaram!
Não olvido porém amor tão santo!
Guardo ainda num cofre perfumado
O lenço dela que molhava o pranto...

Nunca mais a encontrei na vida,
Eu contudo, meu Deus, amava-a tanto!
Oh! quando eu morra estendam no meu rosto
O lenço que eu banhei também de pranto.


A noite começa. A linha se alinha, avinha...

Rui Mascarenhas agita o sarau...

E no embalo dos declamos...

Em sermos tantos, somos só um objetivo...

A poesia urbana cresce...

E com ela também nos construímos...

Atentos solidários integrantes...

Cansada bateria me aflige. Mas o sarau tem pilha:

A arte é manha de vir

A arte é manha de ver
A arti-manha: viver

Poeta Marcelo Tápia ativando o coro:

"A bola rolou em linha reta, sem titubear, e deixou-se cair, exata, no preciso buraco. Moveu-a uma obscura diretriz, despertada por um taco qualquer, torto, inútil, indeciso."


Em comunhão segue a plateia...

Ler é rejuvenescer...

O poeta Binho em cena:
"Quero ver onde essa
América se desmorena
E se contrói
Onde se diz negra
Onde se desmestiça
E se desmistifica
Onde se andina
E se desanda
Quero ver..."

Interpretar é crescer...

Poetando, o Chiu, de Embu das Artes:

"O sol se dispersa no horizonte
como um cão árabe
cujas orelhas
nem vemos mais
entre os edfícios..."


Indelicada lente ofusca dedicada poetisa...

Retirar do papel a voz, é magia...

Mensagem de paz, em agradecer a alegria reinante...

Sarau São Paulo, vibrante palco de emoções...

Onde nossas realidades estabelecem trajetos...

E não há tráfego proibido...

E quem diria, eu, Marco Pezão, declamando Mina da Periferia, neste templo de imortais:

"A minha amada então é flor
Embebo na pétala que me é concedida
Me delicio no prazer. Amor é dom divino
Onde bate, limpa, mancha!
Eu escorrego na alegria do teu ritmo
E não penso mais no sub emprego, na sub fome
E a dor terrível da miséria é nada mais que glória
No aconchego do teu abraço..."

Em seguir os passos da mãe, batalhadora, Dandara e Pedro Lucas...

Materna, compondo versos, Pilar os têm sempre consigo:

"Formas feminis, formas perfeitas
Para eles és bela dos pés à cabeça
Olhar penetrante quando quer provocante
Sem tirar as sobrancelhas conserva a beleza
Essa coisa de pinça agride a natureza

Face com pele de princesa
Boca carnuda grande sensual
Sorriso branco como leite
Um sorriso que nas mentes provoca deleite..."

Em nos despedirmos ávidos por reencontro...

Pedro Lucas interpretou Gaspar:

"Antigamente Quilombos, hoje Periferia
O Esquadrão Zumbizando as origens Z'Africania
Somos filhos de uma terra sagrada
Qualquer Periferia, qualquer quebrada é um pedaço D'África..."

Rui Mascarenhas comandou o imenso e intenso desfile, clarões se agigantam...

Ao Centro Acadêmico XI de Agosto os devidos agradecimentos, e que se promovam outros encontros...

O ambiente é propício. Morada de imortais, Castro Alves e Paulo Eiró...

A Casa das Rosas onde semeia-se esperança e saber...

Particularmente coletiva, Poiesis, uma flor em movimento...

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