Bola rolando. O placar contrário deixa a torcida do Tubarão furiosa com atuação do trio de arbitragem. O Sem Saída segue vencendo por 1 a 0.
Ser juiz de futebol na várzea requer astúcia. Por melhor que conduza a partida haverá senão.
E, neste campo de terra batida, o Tubarão nada. Os torcedores pedem pro time morder. Querem garra. Querem festejar o gol que não acontece.
Enquanto isso, no boteco do Ebrinho, um cara conhecido por Quarenta, de estatura mediana e forte, pede maria-mole.
Num gole, Quarenta sorve o líquido e reclama - Porcaria de time - Nem precisou pedir outra. Meio Quilo já preparava. Nisso, ouve-se o coro dos torcedores anunciar a mãe do árbitro.
- Sacanagem! Vou te dizer. Se alguém xingar minha mãezinha? Pode ser o homem do tamanho que for. Eu derrubo.
Numa golada deixou o copo vazio. Quarenta circula o campo. Aos berros incentiva: Vai Tubarão! Mostra que tu é macho!
Ouvindo próxima exclamação contra arbitragem, recrimina: Ô meu amigo! Tá certo que o diabo do juiz é safado; mas não bota a mãe no meio!
Um ataque pela direita. A bola é lançada e o jogador avança livre em direção ao gol. É grande a chance do empate!
A bandeira é levantada. O apito acusa impedimento. Inconformismo na torcida do Tubarão. Bastou. Foi a gota. A grade balançou. Quase duzentas vozes numa só:
- Ladrão f da p.
Não se sabe como ele conseguiu passar. Pequena brecha do alambrado transpôs cabeça. O resto do corpo foi junto. Ensandecido!
Partiu em direção ao árbitro, que tratou de fugir. O Quarenta atrás. Com a mão direita na cintura segurava um volume sob a camisa.
A impressão é de uma arma. Alguns jogadores se lançaram a persegui-los. A maioria pensou em proteção.
O corre-corre deu duas voltas no campo. Os bandeirinhas sumiram. O arbítrio chegou exausto à porta do vestiário, fechado!
Sentou desconsolado no degrau. Tremeu zombaria das pessoas aglomeradas no portão de entrada:
- Vai morrer! Vai morrer!
Caiu em pranto. Protegendo o rosto aguardou a fúria do seu algoz. A maneira como Quarenta chegou. A postura da mão posicionada é de quem vai sacar o revólver...
- Pelo amor de Deus - Bradou a angustiada alma.
Naquele tenso momento toca campainha de um celular.
Quarenta levanta a camisa... É agora!
Que alívio! Não era revólver, e sim o telefone que ele protegia para não cair!
- Alô, mãe! Tô no campo. Mas, assim, já? É que... Tá bom, mãe. Tá bom, eu vou. Eu vou... Oche!
Olhares ansiosos acompanham o sufoco do indefeso apito. Quarenta apontou o dedo e falou:
- Eu não vou te fazer mal. Vá pra casa e peça perdão à sua mãe por você ser causa da difamação dela. E nunca mais apareça aqui para apitar um jogo do Tubarão.
Dito isso, foi saindo entre fracos aplausos, gritos, falas, e muitas vaias...
- Tanta correria pra nada? Nem sangue, nem porrada?
Decepcionada torcida, então, pro Quarenta, entoou:
- F da p, f da p, f da p...
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